O cepticismo tem vindo a ser defendido por muitos autores de divulgação científica, desde Carl Sagan a Richard Dawkins, entre muitos outros. É evidente, claro, que o cepticismo não pode ser levado ao extremo: questionar tudo é tão inconsequente como não questionar nada. Dominar o cepticismo significa saber diferenciar aquilo que são mitos e crenças, daquilo em que existem provas claras; as coisas que parecem muito pouco prováveis, daquelas que muito dificilmente poderão ser de outra maneira. O cepticismo é a arma que temos para não nos deixarmos enganar, e para estarmos conscientes da realidade do mundo que nos rodeia.
Apesar disso, o cepticismo não está enraizado nas pessoas. Pelo contrário: vivemos numa sociedade dominada por mitos e crenças, o que se comprova pelos estudos estatísticos do que pensam as pessoas sobre evolucionismo vs. criacionismo, pelas histórias de contacto com extra-terrestres, pela importância que muita gente dá à astrologia, pelas crenças em fenómenos paranormais, ou pela cada vez mais famosa teoria de que o homem não foi à Lua, que muitos consideram que pode ser verdadeira. Porquê?
A resposta a esta pergunta - porque é que as pessoas preferem a crença ao cepticismo - pode ser muito complexa, mas penso que uma das razões mais importantes é o medo da morte. Quase todos nós, cépticos e não cépticos, nos deixamos perturbar pela efemeridade da vida. Gostaríamos de viver mais, de ter mais tempo para fazemos as coisas que gostamos. Mas não o temos. Que sentido tem, então, uma vida tão efémera que, com a morte, acaba de uma vez por todas? Para responder a esta perturbante questão, muitas pessoas procuram consolo na crença completamente infundada da vida eterna, entregando-se a ela como se de uma verdade absoluta se tratasse.
O que os cépticos têm defendido é que é preferível estarmos conscientes da realidade, mesmo com os seus defeitos, do que vivermos num mundo de ilusão e de falsas esperanças. No entanto, muitas pessoas não se incomodam com falsas esperanças. Para além disso, os cépticos também dizem que a vida não perde o seu sentido sem crenças divinas e sem mitos paranormais. Alguns, como Carl Sagan, levam o argumento ainda mais longe: o cepticismo e a ciência são mesmo o melhor caminho para o mais espantoso deslumbramento perante o mundo. A propósito, Michael Shermer, no seu excelente livro Porque é que acreditam as pessoas em coisas estranhas, cita o poeta Matthew Arnold para demonstrar esta ideia de que a simplicidade da vida, tal como ela é, deveria ter para nós o maior significado.
Será uma coisa tão insignificante, Ter apreciado o sol,
Ter vivido com leveza na Primavera,
Ter amado, ter pensado, ter feito;
Ter tido verdadeiros amigos, e derrotado incríveis inimigos -
Que devamos fingir uma felicidade De uma data futura incerta,
E enquanto sonhamos com isto, Perdemos o nosso estado presente,
E relegamos para mundos... ainda distantes o nosso descanso?
As crenças generalizadas e a ignorância científica produziram, no passado, as maiores atrocidades, sendo o maior exemplo a caça às bruxas que se iniciou no final da Idade Média. Para que realidades como essa não se repitam, é necessário continuar a cultivar o cepticismo e o método científico, como forma de conseguimos filtrar o que é verdade do que não é; o que é provável do que é improvável; o que é facto e o que é especulação. Ao mesmo tempo, é preciso que se perceba, através de excertos como o que citei acima, que o cepticismo não é inimigo da felicidade. É simplesmente um modo de estar no mundo que nos permite apreciá-lo tal como é, e não como gostariamos que fosse.