O professor Carlos Fiolhais
(re)publicou hoje, no
blog onde escreve regularmente, um texto que tinha publicado pela primeira vez há dez anos atrás, quando a primeira ida do Homem à Lua fez 30 anos. À excepção das correcções que têm que ser feitas em algumas datas para actualizar o texto, continua actual como se tivesse sido escrito hoje. Recomendo vivamente a sua leitura, pois é um dos melhores artigos que li sobre a importância e necessidade da exploração espacial. Sobre o mesmo tema recomendo o fabuloso livro de Carl Sagan,
Pale Blue Dot.
Há uns dias, no site da
CNN, perguntava-se numa
poll que evento tinha sido mais marcante, entre a ida do Homem à Lua, o assassinato de JFK, e outro que não me recordo. O assassinato de JFK ganhava por larga margem (penso que tinha certa de 70%), enquanto a ida do Homem à Lua ficava em segundo (uns 20%). É natural. Embora não fosse vivo na altura (nem quando o Homem foi à Lua), compreendo que esse evento tenha sido das coisas mais marcantes do século XX, sobretudo para Americanos, que certamente representam a maior parte das pessoas que votaram na
poll.
O problema, neste caso, é o facto das pessoas pensarem apenas no imediato, no curto prazo. E, nesse aspecto, o assassinato de JFK pode ter sido, para muita gente, mais marcante. Mas no longo prazo, daqui a vários séculos o assassinato de JFK será esbatido por esse absoluto e poderoso marco histórico, científico e tecnológico que foi a ida do Homem à Lua.
O físico teórico Richard Feynman, nas suas famosas Lectures on Physics, faz uma comparação idêntica, mas para o século XIX: From a long view of the history of mankind — seen from, say, ten thousand years from now, there can be little doubt that the most significant event of the 19th century will be judged as Maxwell's discovery of the laws of electrodynamics. The American Civil War will pale into provincial insignificance in comparison with this important scientific event of the same decade. E tudo isto lembra-me também aquela famosa frase de Einstein: Equations are more important to me, because politics is for the present, but an equation is something for eternity.
Mas e agora? Agora que conquistámos a Lua, o que há mais? Esta pergunta tem sido feita muitas vezes desde que a Lua foi pisada pela primeira vez. A nossa sorte é que a Humanidade não tem qualquer dificuldade em responder a esta pergunta. A curiosidade está na nossa natureza. Somos wanderers, como diria Carl Sagan. E, como disse algum cientista (agora de repente não me lembro quem), "os mistérios do Universo são infinitos, para que haja sempre alimento para a mente humana". Para lá da Lua há, pois, todo o espaço "infinito" à nossa espera. E o primeiro passo será Marte.
Desde sempre que a espécie humana especula sobre a Lua. Sempre sentimos um certo fascínio. Toda a gente sabe onde está a Lua. Já saber apontar para Marte, muito poucos sabem. Todavia, Marte sempre nos fascinou, sobretudo na literatura, desde H. G. Wells a Percival Lowell, nos famosos "canais" que conseguia "ver" na superfície de Marte, de onde tirou as mais grandiosas conclusões sobre uma suposta civilização que lá habitaria. Para além disso, ao contrário de Vénus, seria um planeta eventualmente habitável. Por isso, a chegada humana a Marte será sempre marco histórico extraordináio. Carlos Fiolhais diz, a certa altura no seu artigo, para nos alegrarmos, pois a geração mais nova perdeu a Lua, mas vai ganhar Marte. Tal missão ainda não está planeada, mas quero fazer parte, e acredito que posso fazer, da geração que vai ganhar Marte.
A imaginação de Percival Lowell era muito fértil. Viu canais que não existiam, porque queria acreditar que estavam lá. Concluiu, daí, que uma civilização velha e sábia, mas que tinha gasto todos os recursos do planeta, lá habitaria, e que os canais serviriam para levar a água restante que existia nos pólos a todos os locais do planeta. Tal baseou-se em sonhos, e não em factos. Os marcianos, a existir, serão micróbios. É por isso que Fiolhais termina o seu artigo citando Ray Bradbury, dizendo que "os marcianos somos nós", quando lá chegarmos.
É verdade, de facto: a médio prazo, seremos marcianos. E vamos sê-lo por duas razões: primeiro, porque o avanço que ocorre na ciência e na tecnologia ao preparar-se uma viagem espacial deste calibre é brutal, e tem implicações em muitas outras áreas do desenvolvimento humano (assim como aconteceu com a viagem à Lua); segundo, e mais importante, porque não o fazer seria contra a natureza humana, de curiosos, de exploradores, de wanderers. Mas se passarmos do médio para o longo prazo, provavelmente não vai chegar dizer que somos marcianos. Aí, teremos que dizer que os extra-terrestres somos nós. Pelo menos, até encontrarmos outros.