Todos conhecemos as mais variadas teorias ridículas de conspirações, que a internet faz circular com uma velocidade estonteante. Uma dessas teorias é a de que o homem nunca foi à Lua, e de que tudo é uma gigante farsa. A propósito, vale a pena ler o que o Dr. Carlos Fiolhais disse numa entrevista recente ao jornal universitário A Cabra (sublinhados meus).
C- O que fez os Estados Unidos mandar astronautas para a Lua?
CF- Há um motivo maior e há um motivo menor. O motivo maior não é nacional, mas de toda a humanidade. Os astronautas foram à Lua porque o homem sempre quis ir mais longe. Foram à Lua pela mesma razão que levou os descobridores portugueses a avançar nos oceanos desconhecidos. Porquê a Lua? Parafraseando o explorador inglês que primeiro tentou escalar o Everest: "Porque está lá!" ["Because it's there!"] A Lua é a primeira "estação" que se encontra quando se viaja no espaço a partir da Terra. Não está muito perto, mas também não está muito longe. O motivo menor, embora importante, foi decerto a competição entre os Estados Unidos e a União Soviética nos anos da guerra fria. O Presidente Kennedy anunciou em 1961 que, antes do fim dessa década, um astronauta americano estaria a pisar a Lua e esse anúncio cumpriu-se. Os Estados Unidos mobilizaram para o efeito um conjunto impressionante de meios. Tão impressionante que a viagem não voltou a ser repetida depois do grande êxito que foi a concretização do programa Apollo. Terá valido a pena? A melhor resposta talvez seja a que foi dada pelo primeiro astronauta lunar, Neil Armstrong: "Foi um pequeno passo para o homem mas um passo de gigante para a humanidade". Pela minha parte, espero que esse passo volte em breve a ser dado.
C- Qual a sua opinião acerca da teoria da conspiração segundo a qual os homens nunca foram à Lua? Acredita que o homem lá tenha ido?
CF- Essa teoria da conspiração é tão absurda que não vale a pena perder um minuto com ela. Está ao nível de teorias segundo as quais Elvis Presley ainda está vivo ou a CIA preparou os ataques do 11 de Setembro às torres gémeas. Einstein terá dito: "Só há duas coisas infinitas: o Universo e a estupidez humana, e quanto à primeira não tenho a certeza". Aposto que não demorará muito a surgir uma teoria segundo a qual Michael Jackson ainda está vivo ou que Bin Laden está disfarçado dentro da Casa Branca...
C- Acha que na década de 60 havia tecnologia suficientemente poderosa para fazer a viagem?
CF- Sim, claro. Tanto havia que a viagem se fez e até várias vezes.
C- Mas, relativamente aos argumentos da teoria da conspiração, apresentados na Internet, como lhes responde?
CF- As pessoas que inventam essas patetices é que têm de as provar, não sou eu que tenho de as rebater. Era só o que faltava que qualquer pessoa dissesse um qualquer disparate e o ónus da prova do disparate ficasse do lado de quem o tivesse ouvido. De qualquer modo, encontram-se na web respostas adequadas a afirmações desse tipo, que revelam o mais profundo desconhecimento de leis físicas, químicas e geológicas. Na Internet há muito, muito lixo mas também há, felizmente, bastantes produtos de limpeza.
C - Porque é que os Estados Unidos não voltaram a enviar nenhuma missão à Lua?
CF- Acima de tudo por falta de vontade política, num mundo onde já não há guerra fria. A tecnologia para repetir a proeza é conhecida e está acessível, embora não seja barata. Espero que a ideia de uma base habitada na Lua ganhe força assim como a ideia de a usar para servir de trampolim numa viagem mais além, nomeadamente ao planeta Marte. Um pouco mal comparado, é semelhante ao estabelecimento pelos descobridores portugueses de uma base na ilha da Madeira antes de avançarem para sul, na costa de África... Será o Presidente Obama capaz de relançar o sonho espacial? Que sim, é o meu oxalá.
Acredito que é papel da ciência explicar às pessoas os seus argumentos, e desta forma mostrar-lhes que estas teorias da conspiração não têm sentido. E, nesse sentido, os "produtos de limpeza" de que Carlos Fiolhais fala, e que existem na internet, são óptimos. Um deles é este site.
Por outro lado, é demasiado irritante outro aspecto referido por Fiolhais: "Era só o que faltava que qualquer pessoa dissesse um qualquer disparate e o ónus da prova do disparate ficasse do lado de quem o tivesse ouvido". Daí eu pensar sempre duas vezes antes de entrar numa discussão pateta deste género. Nunca é de desprezar aquela velha máxima da argumentação com um idiota, que primeiro nos faz descer ao nível dele, e depois nos ganha em experiência.
O esquema destas teorias da conspiração é sempre o mesmo: querer passar o ónus da prova para o outro, e questionar tudo até ao limite, até ao ponto em que as coisas já não podem ser questionadas, sob pena de estarmos a entrar numa discussão filosófica inconsequente e irrelevante. Como disse, uma vez, Richard Feynman, nas suas famosas Lectures on Physics, We can't define anything precisely. If we attempt to, we get into that paralysis of thought that comes to philosophers… one saying to the other: "you don't know what you are talking about!". The second one says: "what do you mean by talking? What do you mean by you? What do you mean by know?".